Sunday, 27 July 2008

Peixe e Pão

>foto obtida aqui


Acordei esmagado por um peso enferrujado que me corroía o coração.
Dirigi o olhar, turvo e cansado, para a janela semiaberta e por entre as cortinas vislumbrei o cinzento de Outono...
Adivinhei o regresso à calma.
Sentei-me no banco. Há demasiado tempo que não ia àquele jardim. Continua tudo na mesma. As ondas insistem em procurar alcançar a lua, o areal mantém a indiferente calma para suportar as suas quedas... e as pessoas continuam sem aparecer, parece que só eu compreendo a beleza e a magia daquela paisagem.
Melhor assim, isto perde a piada toda quando o povo surge...
Vi este pássaro em forma de gaivota a explorar o ar minuciosamente, tenho até a impressão de que não é a primeira vez que o vejo.
"Ò Fernão! Anda cá! Queres pão?" - gritei eu, mas o raio do bicho ignora-me, prefere o peixe que apanha por ele mesmo. E está certo, vou aconselhar os pombos a largar o raio dos monumentos... Começa a escurecer. Não fossem as nuvens, magníficas residências aéreas de deuses outrora homens, haveria ali um ocaso daqueles...
Prós e contras.
Envolto na escuridão, puxo de um cigarro e começo a divagar... quem me dera ter a minha viola aqui, poderia então divagar musicalmente... começo no passado, como sempre, recordações que doem. Mágoas julgadas esquecidas, nódoas negras que se assemelham a buracos negros devoradores de sóis distantes...
Vejo uma estrela cadente. Suspiro um desejo em silêncio, enquanto a primeira lágrima se aventura na existência...
Sorrio ironicamente, primeiro por saber que confundir os modos temporais neste texto não tem lógica nenhuma, depois por me lembrar de estar lá sentado, à beira-mar, em plena madrugada, sorrindo também ironicamente, ao constatar que o meu único desejo era voltar atrás no tempo...
Deito fora a beata e abraço-me.
Estou só... onde pára o mundo? Porque tarda tanto em parar?... a tortura satura-me, já não aguento mais...
Queria que descesse um anjo dos céus e me dissesse: "Acabou. Baza comigo." - e eu ia.
Sem pestanejar.
Arrancar-me deste chão, duro e frio, húmido de lágrimas, suor e sangue...
As minhas lágrimas...
O meu suor...
O meu sangue...
Deito-me enquanto acabo o último cigarro. Está frio...
Sim, esquece essa merda. Dorme e sonha. Afinal, o que é que te resta?
Até amanhã.



*98

3 comments:

Anonymous said...

sorrisos

Anonymous said...
This comment has been removed by a blog administrator.
Shiu said...

Após uns anos decidi sorrir de volta. :)